sexta-feira, 21 de junho de 2013

O Impiedoso País das Maravilhas e o Fim do Mundo de Haruki Murakami


Sinopse
“Duas histórias paralelas desenrolam-se em cenários sugestivos. Uma decorre numa misteriosa cidade murada - o Fim do Mundo. A outra, numa Tóquio futurista, num gélido e desapiedado país das maravilhas.

Ao chegar à cidade fechada nos confins do mundo, o narrador vê-se privado da sua sombra. As suas recordações começam, pouco a pouco, a desvanecer-se, à medida que assume a tarefa de leitor de sonhos num lugar povoado por habitantes possuidores de estranhas carências anímicas e percorrido por unicórnios dotados de uma pelagem que se torna dourada no outono.
Na segunda história, um informático com trinta e cinco anos, ao serviço de uma duvidosa entidade, envolve-se com um cientista que tem tanto de genial como de enigmático. Que representam de importante para o futuro da humanidade as misteriosas experiências que colocam em risco as cobaias? Quem são os obscuros Invisíveis? Qual o significado das criaturas rastejantes e malignas que escorregam dos buracos ocultos, vagueando pelos tenebrosos subterrâneos? É precisamente no fundo da sua mente que o herói encontrará a solução do mistério que liga as personagens destes dois mundos.

... Um acelerador de partículas narrativo percorre o romance, num movimento de zoom, aproximando-se e afastando-se de crânios de unicórnios e bibliotecárias vorazes. Wild Turkey e Bob Dylan. Charlie Parker e Lord Jim. Turguéniev e O Homem Tranquilo. Paixões em Fúria e Lauren Bacall. Dostoiévski e os Police. ‘Danny Boy’ e a música reggae. Há todo um mundo de referências nesta poderosa alegoria sobre os tempos modernos.”


No momento em que fechei a última página, fiquei a olhar para a contracapa onde surge o seguinte parágrafo:

“ – Consigo ler o teu coração. E vou conseguir uni-lo num todo. O teu coração deixará de ser um coração perdido e fragmentado em mil pedaços. Está aqui e ninguém vai poder arrebatar-to. – Tornei a pousar os lábios sobre as pálpebras dela. – Deixa-me aqui sozinho – pedi. – Quero ler o teu coração antes que a manhã chegue. A seguir, dormirei um pouco.”

Depois fiquei com a sensação de um vazio. Aquelas personagens, aquele mundo que me acompanhou por uns dias, enquanto durou a sua leitura, iria deixar de fazer parte do meu dia a dia. 

Um livro, na minha opinião, verdadeiramente fantástico. 

Escrito em 1985, vencedor do Prémio Tanizaki (um dos prémios literários mais prestigiados do Japão e é atribuído, desde 1965 a obras de ficção ou drama, escritas por profissionais) só recentemente chegou às nossas livrarias. Classificado como Ficção Cientifica. (se bem que por vezes me questiono onde fica a fronteira exacta, que classifica um livro, quando este não pertence claramente a um determinado género literário)

Como já se encontra referido na sinopse, este livro apresenta duas histórias em paralelo, uma nos capítulos pares e a outra nos capítulos ímpares. Ao longo das suas páginas vamos acompanhando dois mundos, duas sociedades e duas narrativas completamente independentes. Apenas uma característica comum: ambas são escritas na 1ª pessoa, dois homens sem raízes, que procuram a razão da sua existência, perdidos nos seus mundos, sem se cruzarem ao longo de toda a narrativa.

O País das Maravilhas apresenta-nos a cidade de Tóquio, numa realidade aparentemente normal, onde um informático é solicitado para desenvolver um trabalho junto de um velho cientista. Como todo o verdadeiro cientista, este “avô” tem a sua cota de genialidade bastante apurada. Sem perceber bem como, o nosso personagem vê-se envolvido num projecto altamente secreto, constituindo, ele próprio, um alvo de procura por parte das várias facções do poder, uma vez que o seu cérebro funciona como um processador de dados, capaz de registar e criptografar informação.

O Fim do Mundo apresenta-nos uma cidade, rodeada por uma muralha intransponível, onde as pessoas vivem despojadas dos seus corações e das suas sombras. Nesta, o homem chega e é-lhe atribuída a função de leitor de velhos sonhos em crânios de unicórnios, mas para tal vê-se privado do Sol e da sua sombra. Sem memórias, resta-lhe apenas o seu coração para compreender o que se passa ali.

Folha a folha, vamo-nos conectando com as suas vidas e com os simbolismos que o autor tanto gosta de utilizar nas suas obras. Surgem-nos as questões: o que significam os crânios, os unicórnios, a sombra, os velhos sonhos? Será que há algum relacionamento entre estes mundos paralelos? Muitas outras perguntas vão surgindo, mas Haruki faz-nos esperar pelo tempo certo para as respostas, nada é apresentado ao acaso, mas sim inserido numa trama que se vai desenrolando num tempo próprio ao longo de todo o livro.

A comida (há sempre quem coza esparguete), bem como as referências musicais são sempre uma constante nos seus livros, sendo que aqui acresce o gosto pelos clássicos da literatura.

No meio do desenvolvimento de toda a história, surge no nosso pensamento outro tipo de questões, de facto qual o papel da evolução nas nossas vidas, de que forma ela poderá condicionar-nos num futuro e quem somos, enquanto seres humanos providos de um coração, de sentimentos e sonhos. 

Como refere o velho cientista no inicio do livro: “uma evolução feliz é coisa que não existe.”

É muito difícil descrever a escrita de Haruki Murakami,. Acredito que ou se gosta bastante ou então não se gosta, e as duas opções são válidas.

A sua escrita apresenta-nos episódios divertidos, recheados de um humor muito próprio. Os diálogos são muito bons, fluem naturalmente. Escreve com uma ternura aliada a um misticismo que nos deixa sempre com um sorriso. 

Para mim como já referi mais do que uma vez Haruki Murakami tem uma escrita deliciosa e é um excelente contador de histórias.

12 comentários:

  1. Quero tanto ler este livro. Desde que o vi pela primeira vez numa estante fiquei apaixonado pelo título e pela capa. Depois pela sinopse. E depois li a primeira página na Bertrand (os trabalhadores começaram a olhar para mim e não pude ler mais xD) e também fiquei apaixonado, intrigado, curioso e ansioso por poder ler este livro. Em breve, prometo, vou lê-lo. Prometo :)

    Abraços e... boas leituras!

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    1. Pedro, bem vindo :)
      Na wook tens o primeiro capitulo disponível em pdf, para quem nunca leu Murakami, dá para perceber um pouco do estilo da sua escrita e podes sempre conhecer um pouco da história.
      O livro é muito bom e lê-se num instante, é o quarto que leio deste autor e apesar de ter gostado de todos é, na minha opinião o melhor.
      Lê se te apaixonou tanto, vale bem a pena
      fico à espera de ver o teu comentário

      Abraço e boas leituras também para ti

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  2. Olá amiga Caminante,

    Bem já sabia de toda essa tua paixão quer pelo escritor, quer por este livro em particular, pois foste-me mostrando o fascínio que estava a ser a sua leitura.

    Eu apenas li um livro do escritor e não me deixou completamente "vidrado" Sputink meu amor, mas deixas-me sempre cada vez mais curioso com os teus comentários e este não foge à regra, que comentário excelente, aliás demonstra o quanto gostaste do livro.

    Estou a ver que tenho mesmo que arranjar maneira de ler o livro, é bom saber que habita ai o teu reino :D

    Está visto que vai ser o teu livro do ano :)

    Bjs e continuação de boas leituras ;)

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    1. Olá Fiacha
      Vou começar a responder-te pelo fim :D . Quanto a ser o meu livro do ano, ainda é cedo pois faltam 6 meses de leituras e nunca se sabe o que vai aparecer, mas é um forte candidato. Ainda tenho para ler o 1Q84 que são três volumes e há quem diga que é o melhor do Murakami.
      Ele habita a minha estante e como sabes poderei emprestar-to, mas penso que irás esperar, a não ser que o queiras ler já. Pois já prometi emprestá-lo ao Rui e a uma amiga.
      Mas depois pode-se combinar.
      Eu gostei bastante do Sputnik, mas é muito diferente deste. Dá, no entanto para ver o tipo de escrita do autor.
      Quanto a este livro, gostei muito mesmo, como já te tinha referido e é bom saber que transmiti isso no meu comentário.
      Bjs e boas leituras para ti também ;)

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  3. Olá A caminhante,

    adorei sua resenha e o livro parace ser muito bom mesmo, vou ver se consigo em e-book,afinal uma das funções do blog, é fazer com que as pessoas conheçam outros livros, mas este parece ser especial, pois se chegou ao ponto de lhe deixar um vazio quando terminaste de ler, sei como é isso, e acho muito bom nos envolvermos dessa maneira com os livros e seus personagens!

    Abraços e boas leituras!

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    1. Olá Amanda, bem vinda :)
      O livro é muito bom, pelo menos para mim. Ás vezes penso se estou a entusiasmar demasiado as pessoas e depois elas não tem a mesma opinião que eu...mas é a minha opinião.
      Se o encontrares experimenta, penso que irás gostar também.
      Boas leituras
      Um abraço :)

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  4. Olá ;)

    Já recebi tantos elogios por si deste livro, que sempre que passo por ele fica a promessa no vento que um dia o irei resgatar do desejo de o ler..

    Fica para breve :D

    Obrigado pela partilha desta leitura..

    Beijinhos

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    1. Eu sei que já falei muito neste livro, tanto que por vezes penso se não estou a falar demais e crio espectativas demasiado altas nas pessoas.
      Nem todos somos iguais e nem todos gostamos das mesmas coisas.
      Mas ainda assim, depois deste desabafo, é um livro excelente eh eh :D

      beijinhos

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  5. Olá caminhante! Grande análise. Este livro está na minha lista para futuras leituras e agora ainda fiquei com mais vontade. Se ler depois digo-te o que achei!

    Boas leituras!

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    1. Olá Luís, obrigado pelas tuas palavras.
      Acho que deves mesmo ler, pois penso que já conheces este senhor e os seus livros. De todos os que li até agora dele, este é o melhor.
      Quando terminar a saga do Gene Wolfe que estou neste momento a ler, vou avançar para o 1Q84 dele.
      Vou gostar de saber a tua opinião.
      Boas leituras para ti também

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  6. Olá Caminhante =)

    Vim ler a tua opinião e fiquei muito curiosa! Estou a pensar dar uma oportunidade a este autor. Já andava há algum tempo a pensar nele, uma vez que está sempre em destaque nas livrarias e nos sites dos livros, daí ter perguntado, e agora vejo que pode ser algo que me agrade.
    Os conceitos que referiste como parte da história parecem-me fascinantes e mágicos, e foi o que mais curiosidade me despertou ao ler a tua opinião. E já agora, excelente opinião! :)

    Beijinhos e boas leituras!

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    1. Olá Maria
      Obrigada pelas tuas palavras :)
      Normalmente as pessoas começam pelo "Sputnik meu amor", que é um livro mais pequeno e menos "louco".
      Mas acho que podes mesmo começar por este, porque sei que gostas de Fantasia e FC (pelo menos do Dr. Who, também ando a segui-lo :) )
      Penso que irás gostar
      Bjs e boas leituras

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